quinta-feira, 28 de julho de 2011

Vencer, vencer, vencer

Há quem não entenda, há mesmo quem recrimine, há quem chame de alienação. Sou da geração “panis et circenses”, sou dos apreciadores do “ópio do povo”, anestésico das dores da vida, panaceia de todas as dificuldades. O corpo maltratado pelo tempo, sofrido pelo peso de quase seis décadas. Estou perto de vinte e cinco mil dias teimosamente me mantendo de pé, embora concebido para andar de quatro. Apesar de tudo preservo a alma intacta, invicta, soberana. A cabeça vai bem, obrigado. Responde aos desafios da memória com a rapidez de um jovem e a lucidez de um experiente senhor.
Vi muita coisa de bom grado e de melhor grau, do graúdo ao gradual, valentia e covardia andando juntas. Com a licença dos poetas, mantive a mente aberta, a espinha ereta e o coração tranquilo, fazendo tudo valer a pena, pela minha alma não ser pequena. Não tenho mágoas nem inimigos, quando muito adversários. Realimento o espírito com pequenos e grandes prazeres, indistintamente.
Renovo a energia com vitórias maiúsculas, consagradoras, marcantes, inesquecíveis. Aprecio em especial as transcendentais, aquelas transformadoras de ânimo, operadoras de mudanças no humor, verdadeiras redentoras dos presságios negativos. Contra qualquer conjunção de fatores elas se impõem pelo vigor de fileiras avassaladoras. Épicas e comoventes, reparam cicatrizes antigas e aplacam a sede de vencer. O sangue sobe aos olhos e os embaça, os dedos se crispam, as veias estufam e a voz supera o nó asfixiando a garganta. A libertação do jugo dos tempos é coletiva, heterogênea, impessoal. Mas também unifica, solidariza e aproxima. Num instante somos um e noutro somos todos, diversos, estranhos, desiguais.
O grito de gol vem do mais profundo recôndito do peito, explode em meio a labaredas, tem alto poder de propagação. Trata-se de uma força desconhecida, de grande magnitude, represada sob risco de morte. Depois de uma partida de futebol, embora os problemas persistam, a vida parece diferente. Ficamos mais fortes, mais confiantes, mais otimistas, mais felizes. Nada altera o curso do destino, apenas nos sentimos em condições de retraçar o caminho. Muitas vezes funciona, abrindo perspectivas imprevisíveis. Não resta a menor dúvida de que o futebol perdoa os que fingem odiá-lo e abençoa os que demonstram amá-lo.
Semelhante ao desfile das escolas de samba, cuja duração se dá de forma mais restrita, o futebol é democrático, tem o condão de mexer com ricos ou pobres, sadios ou doentes, velhos ou moços, fracassados ou exitosos. Ele serve a todos, abraçando causas nobres ou escusas. Mais do que qualquer outra coisa, ele fortalece qualquer um. Foi assim que dormi realizado após o Flamengo 5 x 4 Santos e acordei poderoso no dia seguinte. O problema passa a ser dos meus problemas, quando uma grande vitória me faz superior a eles.

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