segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Imagens fugazes



Vivemos num ritmo desenfreado, supondo buscar a felicidade. Se pudéssemos materializá-la, ela seria a paisagem emoldurada pela janela de um trem-bala. No início da viagem conseguimos perceber alguma coisa. À medida que a velocidade aumenta, enxergamos apenas borrões. Voltamos a ver com nitidez somente ao nos aproximarmos da estação de destino. Não havendo como retroceder, as cenas ficam no passado e de maneira inapelável o percurso chega ao fim. 

Nossos dias se repetem num moto contínuo e muitas vezes sequer desfrutamos das melhores paisagens nas janelas dos vagões da vida. Meros passageiros, transitórios ocupantes de um lugar permitido, nos preocupamos com o destino e deixamos de usufruir da jornada. Ainda que a física quântica explique a dualidade dos fótons, os mistérios de nossa existência requerem esclarecimentos mais simples. Parece que, de repente, inspirar e expirar por instinto se transforma em algo insuficiente. Precisamos de maior aprofundamento.

As doses homeopáticas da sabedoria nem sempre pingam em nossos olhos as gotas do colírio da clarividência. Com as vistas congestionadas pela poeira da ignorância, a visão embaçada pela imprecisão das imagens, nos resignamos a não enxergar e seguimos em frente. Sem a beleza das formas e seu colorido mais exuberante, nos acostumamos com um mundo desfocado e monocromático. Isso tudo sob a alegação de estarmos perseguindo a felicidade. Exceto os felizes de verdade, resta a maioria entristecida pela conclusão tardia do engano cometido.

domingo, 12 de agosto de 2012

Elos da corrente



Há quarenta e um anos abracei meu pai pela última vez no Dia dos Pais. A coincidência do número se estende à idade que ele tinha quando um mal súbito nos privou de sua companhia. Eu nem completara quinze anos ao sofrer essa perda. Minha vida prosseguiu com a sustentação familiar proporcionada pela minha mãe, uma heroína na solitária criação de dois filhos. 

Passado todo esse tempo de muitas realizações, alguns insucessos, inúmeras alegrias. Tive filhos, conquistas inesquecíveis, êxitos pessoais, enfim, tanta coisa não compartilhada com quem eu pouca oportunidade tive de conviver. Dos quase cinquenta e seis anos da minha vida, na maior parte dela não pude contar com a presença inestimável da figura paterna.

Mas sinto que de alguma forma ele sempre esteve comigo em todos os momentos. Não sei explicar as razões e nem possuo embasamento suficiente para tal, apenas percebo. A ciência e a espiritualidade andam cada vez mais próximas, reforçando a minha impressão de que outras respostas ainda estão por vir.

Hoje, mais uma vez, não posso abraçá-lo. Minha mulher vive o primeiro Dia dos Pais com semelhante ausência. À medida que envelhecemos, outros tantos vivenciam a mesma inexorável experiência dessa lacuna. Trata-se da ordem natural das coisas. Terminada a jornada, ficam os ensinamentos, os exemplos, a inspiração e o legado. Em especial, a sensação de missão cumprida.

Estejam onde estiverem, nossos pais permanecerão conosco. Protagonistas de nossa existência, carregaremos sua herança genética até o último de nossos dias. Quanto mais profícuo for o replantio de suas sementes, mais perene sua permanência. Viramos cúmplices da eternidade ao nos tornarmos pais, nos metamorfoseando em elos de uma corrente com a presunção de não ter fim.
Nessa hora aumenta a importância de nos desejarem um Feliz Dia dos Pais.