segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Márcia, a menina do Pedro II



Houve um dia, perdido no tempo, você era uma menina com o uniforme do Pedro II e me conquistou. Éramos jovens, você mais do que eu, mas o amor nos invadiu por completo, na plenitude dos hormônios e dos sonhos. A felicidade escancarou portas e janelas do meu coração, clarão de uma luminosidade sem igual, compassada, mas poderosa. Evoluímos juntos, caminhamos lado a lado, amadurecemos ideias, rumamos um pouco em paralelo, nos unimos em definitivo, de corpo, mente e alma.
Você passou a ser minha inspiração, minha namorada, minha amante, minha companheira, minha parceira nos dois mais importantes frutos do nosso amor. Lutamos nas mesmas trincheiras da vida, enfrentamos enganos, incertezas e nos fizemos mais fortes ao nos completarmos. Você, com sua elegância e altivez, numa sensibilidade silenciosa, embora sempre atuante e decisiva.
Traídos pelo destino, quando as flores mais vicejavam nos obrigamos ao maior enfrentamento, a aceleração de sua contagem regressiva. Desviei meus rumos e me abracei a você, estreita e apaixonadamente. A corrente nos arrastava implacável na irreversibilidade da doença insidiosa. Mesmo os pequenos ramos nas margens serviram de apoio para a retomada, de base para a superação. Sua valentia me reenergizava, me enchia de ânimo, me ampliava o horizonte.
Na inclemência do virar da ampulheta os grãos escoaram entre os dedos da justiça e arrancaram do livro da minha existência as páginas finais mais belas. Por cima das cortinas a censura invejosa abreviou esse romance, impedindo nossa velhice apaixonada ao cortar os cordões das marionetes enamoradas. Alegaram egoísmo de quem ama, materializado na manutenção do sofrimento apenas pela querência longeva. Travei contra isso o embate derradeiro, abri meu coração iluminado e permiti que sua luz escapasse em nome de sua preservação.
Hoje você brilha longe de mim, num lugar escolhido pelo Grande Arquiteto do Universo, num plano melhor e sublime, perfeição a quem fez jus. Só me resta sentir a saudade doída e avassaladora da amada perdida. Meu caminho prosseguirá a esmo, solitário e triste. Descanse em paz minha guerreira, até logo meu grande amor. Resplandeça a sua luz de onde estiver. Permanecerei aquecido pelo seu calor, guiado por sua claridade, protegido pela sua aura. Nossa história não acaba assim. Ela continuará viva em meu coração, em meu pensamento, em minha alma. Como tem sido desde a primeira vez que vi aquela menina com o uniforme do Pedro II. Eu te amo.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Viva la vida




For some reason I can't explain
I know Saint Peter won't call YOUR name
Never an honest word
But that was when I ruled the world

Se mais não posso, mudei os versos de Viva la vida, a música do Coldplay que ecoa nos meus ouvidos qual um hino, espécie de trilha sonora de uma árdua caminhada de alguns anos. Sigo me perguntando por que a ciência nos abandonou? Enquanto se busca outras respostas não prioritárias, há doenças sem solução.
O estágio atual dos estudos nos assemelha a uma ameba doente com pretensões a viagens espaciais. Em paralelo às ameaças de um mundo materialista a nos açoitar a todos, a vida segue o seu rumo inexorável, sem data de validade conhecida.
Prisioneiros dessa interrogação, permanecemos atrelados ao egoísmo de manter os entes queridos agrilhoados por elos desejados indestrutíveis, ao custo do sofrimento daqueles que tanto amamos. Num apego mais forte do que a consciência, somos dominados pela sofreguidão de preservá-los ao nosso lado a qualquer preço. Tememos pelo desenlace, não aceitamos o rompimento, inobstante a dor e o desconforto de quem precisa partir.
A dificílima decisão me confunde os sentidos, embaçando a visão lacrimejada, abafando o som da súplica sussurrada. Parece nos apequenar ante um repentino antagonismo: a luta persistente dos que nos aliamos às batalhas diárias pela sobrevida tem que dar lugar à resignação da desistência. O desapego se faz necessário para o descanso dos guerreiros. O amor sempre precisa superar o egoísmo, em especial nesse momento. Se a arte de viver tem enigmas a decifrar, o amor tem mistérios a desvendar. E o importante é o verdadeiro amor.