sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Amigos

Amigo, refúgio para as dores do corpo e do espírito, em especial essas últimas. Não me queixo da sorte, pois fiz grandes e muitos amigos ao longo da vida. Transitei em ambientes os mais diversos, por origem, residência, formação escolar e dever de ofício. Em todos eles me relacionei com a heterogeneidade do ser humano, misterioso cadinho de nossas dessemelhanças. A natureza humana consegue nos fazer ao mesmo tempo tão iguais e tão diferentes, criando fatores que nos aproximam e nos distanciam dos demais, umas épocas mais outras menos.
Tenho muito orgulho das amizades sólidas construídas em minha caminhada por lugares realmente díspares, desde o local humilde onde nasci, passando pelo seleto grupo das escolas que frequentei, mais tarde encontrando a miscigenada reunião de parceiros da idade pós-adulta e finalmente nos corredores empresariais. Conheci e me aproximei de nobilíssimas pessoas no decorrer da existência. Com elas aprendi demais, numa permuta de experiências muito ricas, amalgamando a minha essência.
Um texto limitado por caracteres e pela paciência de quem lê não faria justiça à legião de parceiros e de parceiras que dividiram, dividem e dividirão suas histórias comigo. Obviamente, com eles desfrutei da melhor maneira dos bons momentos, neles me apoiei e soube apoiar nas incontornáveis agruras. Juntos vencemos pequenos e enormes desafios, mesmo quando a ausência de um ou outro desfalcou a união de esforços. Na impossibilidade da presença física, nos completamos mental e espiritualmente, através do aprendizado, da lembrança, do mútuo saber adquirido.
O verdadeiro amigo configura uma escolha de muitos e complexos quesitos, mas requer poucas e singelas explicações. Um deles uma vez me disse, da forma mais incontestável e convincente possível, ser capaz de me dar um de seus braços se eu necessitasse. E ele não falava no sentido figurado, mas tratava da disponibilização de parte do seu corpo. Jamais me esquecerei disso, a mais consistente demonstração de um laço de fraternidade não consanguínea que tive. Generosamente aquinhoado, recebi muitas outras traduções de identificação dessas importantes almas próximas de nós, algumas eu diria gêmeas até.
Há uns quinze dias recebi ligação telefônica de um deles. Ele e sua mulher meus companheiros de longa data, da mais tenra infância. Eles nos convidavam para conhecer a sua nova casa, confirmando uma sinalização feita anteriormente e já ajustada com outras pessoas. Por razões alheias à minha vontade, bastante justificáveis, minha esposa não estava em condições de atender ao convite. Diante da impossibilidade, me desculpei pela ausência forçada. Ao que ele respondeu com o adiamento da reunião, sob a alegação de que não consideraria completo o seu círculo sem que estivéssemos presentes. Pode parecer uma atitude inesperada ou sensata, dependendo do ponto de vista. Entenda-se como for, tocou-nos bastante.
Hoje lá estaremos, minha mulher e eu, felizes e recompensados por uma atitude tão simbólica quanto os beijos, os abraços demorados e os apertos de mãos que autenticam mais um reencontro de destinos. A sinceridade de um gesto simples esconde o poder da modificação de ânimo de quem o recebe. Somos muito mais importantes do que os problemas que nos afligem, mais poderosos do que as eventualidades, mais curativos do que a droga de maior eficácia. Apenas ainda não temos a noção precisa dessa força, oculta em neurônios subutilizados. Enquanto a ciência não desvenda o mistério das inexploradas conexões cerebrais, somos conectados pelos amigos, de mesmo sangue ou não. A genética nos faz parentes. A vivência nos faz amigos.

4 comentários:

  1. Meu irmão, após o Verbo nos fazer carne, você conjuga tantos outros predicados que se mostra sempre mais que perfeito! Brilhante!

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  2. Alexandre, mais um belo texto com a sua marca de excelência no domínio da linguagem e repleto de sensibilidade. Parabéns!

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  3. Esse sentimento é a presença do Maior Amigo que existe e que abençoa todos os demais.

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  4. Querido AMIGO!!!
    Não consegui me segurar e estou chorando aqui na Universidade.Muitas lembranças da mais tenra infância.Brigas em futebol de botão!!!Acho que poucos conseguem cultivar amigos como nós.Acho que posso dizer que sou feliz.

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