quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Pretérito Perfeito

Podem diser que sou purista ou romântico. Estou me sentindo cada vez mais uma peça de antiquário. Sou do tempo em que jogos da seleção brasileira de futebol eram um compromisso obrigatório de qualquer torcedor. Quando ainda não se transmitia com tanta freqüência pela TV, procurávamos um rádio onde fosse possível acompanhar os lances da partida. A camisa amarela era sinônimo de uma idolatria saudável e vitoriosa de todos os amantes do futebol.
Hoje as coisas mudaram muito e a CBF transformou o futebol brasileiro num balcão de negócios pelo mundo, prostituindo a marca de tal forma que tem gente que às vezes nem sabe que há jogo disputado pelos brasucas. Aliás, nem sei se podemos chamá-los assim, diante da pouca identificação com o país, com o povo e com a simbologia do futebol tupiniquim. Os expatriados do esporte nacional nem de longe lembram os meus ídolos do passado, mesmo aqueles em ação naquela época nas ligas estrangeiras.
O melhor exemplo da globalização contaminada do violento esporte bretão se encontra nos jogadores nascidos no Brasil que optam pela nacionalidade de outro país, onde defendem outros selecionados. As tênues regras da FIFA ajudaram a ridicularizar as raízes dos atletas. Hoje estão descaracterizadas as escalações mundo afora, seja pelo perfil da raça, pelo nome ou pelo idioma falado pelos atletas convocados. Na trajetória das câmeras pelos jogadores perfilados no momento da execução do hino, podemos facilmente reconhecer quem é quem.
Após a bola rolar, agora o time com a amarelinha parece o dos adversários de antigamente, com jogadores de cintura dura, aqueles aos quais o Nelson Rodrigues atribuía o apelido “saúde de vaca premiada”. A arte requintada nas obras primas com a bola, o finesse no trato rebuscado com a redonda, ficaram na memória dos mais velhos, inclusive eu. Nos dias de hoje, não raro nos flagramos aplaudindo mais os que vestem outras camisas, bem como exaltamos as revelações mundiais nascidas aqui e exportadas ou cujos pais jogaram na seleção brasileira ou em clubes do Brasil.
Trata-se de um incômodo fenômeno, palavra que preferíamos usar no apelido de um dos últimos dignos representantes da casta de craques nacionais, o Ronaldo. Com ele vivemos do passado, às vezes do passado presente, caso do Ronaldinho Gaúcho, eleito o melhor do mundo mais de uma vez e hoje jogando por aqui. O resumo dessa ópera bufa se viu no Alemanha 3 x 2 Brasil de ontem. Eu não assisti, tal qual milhões de brasileiros. Mas o prestígio do futebol brasileiro assistiu de cabeça baixa e envergonhado.
A camisa “amarelinha” está se acostumando à derrota na mesma velocidade em que muda o figurino e se assemelha a outras por exigência do fabricante multinacional. Enquanto isso, no selecionado alemão há turcos, poloneses e um brasileiro, o paulista Cacau, cuja nacionalidade é indiscutível. Também soube hoje que estreou pela Espanha um menino muito bom de bola chamado Thiago, filho do Mazinho, ex- integrante do time canarinho tetracampeão em 1994. O Thiago foi o 35º jogador estrangeiro convocado para uma seleção espanhola. Estranho, muito estranho, esse mundo globalizado, no qual a FIFA e a CBF são tão ricas e o futebol tão pobre.
A camisa da seleção canarinho que tanto nos alegrou virou artigo retrô. O futebol praticado pelos nossos compatriotas, idem. Tudo está muito mudado. Nós também. Em homenagem à perfeição dos áureos tempos, já escolhi o nome do antiquário onde vou morar: Pretérito Perfeito.

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