quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Quebra-cabeça

Somos parte de um incomensurável quebra-cabeça, daqueles que demoramos muito para entender e completar. Metáfora interessante. Muitas peças se mostram semelhantes, mas cada uma tem um encaixe diferente e específico, desempenhando papel único no resultado. Há diferenças sutis que só observamos com muita atenção, porém distinguem as unidades antes que elas se incorporem ao conjunto. Em meio à aglomeração desorganizada das partes, misturadas e se confundindo entre elas, impossível enxergar a concepção do modelo.
Muito mais do que isso, o quadro resultante da homogênea união dos fragmentos só se descortina com precisão absoluta após a colocação do derradeiro item. Contemplamos o desfecho somente após a combinação de todos os pedaços. Assim é a vida. Temos que aguardar pela conclusão do plano arquitetado, acompanhando com a devida atenção cada etapa que se revela, procurando entender onde e como encaixar o segmento posterior. A definição plena do que está planejado para nós se traduz na composição passo a passo. À medida que os contornos vão formando as imagens com nitidez, o esclarecimento fica mais fácil.
Assim, na conhecida reflexão dos mundos paralelos, fazemos parte do quadro maior, somando na coletividade dos incontáveis pequenos itens. Vamos nos ajustando aos demais e configurando a tela. Entretanto, cada um isoladamente possui vida própria, constituindo um quadro particular. Esse é fragmentado em inúmeras cenas que se aglutinam para consolidar a existência de todos nós. Num ou noutro exemplo, a montagem do quebra-cabeça restringe a identificação às figuras definidas. Precisamos concluir para interpretar corretamente o que pretendem indicar.
Dia a dia nos detemos na lúdica movimentação de seres e de objetos, componentes performáticos da suposta brincadeira de viver. Questionamos quando não encontramos razão aparente para a resolução dos encaixes. Insistimos até concluirmos que determinadas peças não podem ser utilizadas em determinados momentos, decepcionamo-nos com a ilustração parcial. E em seguida reavaliamos conceitos, percebemos novas alternativas, aceitamos as instruções do manual do destino, as respostas da intuição na escolha. Sentimo-nos realizados no preenchimento das lacunas pendentes, expressando num esgar de satisfação represada o sucesso da temperança contemplativa. A visão ampliada, sob diversos ângulos, favorece a opção mais adequada. No labirinto de tantos caminhos, aprendemos a analisar a mesma situação muitas vezes, até descobrirmos a saída.
A caixa de nossos milhares de peças não tem a gravura que orienta o passatempo, diferença fundamental da realidade para o entretenimento. A paisagem pré-concebida simplifica o processo e manualiza o raciocínio. A felicidade nos espreita em cada gesto, torcendo que acreditemos no porvir, porque o incompleto ainda não chegou ao fim. Juntar os pedaços com alegria, aprendendo com erros e aguardando pelo cenário perfeito, eis o mistério do quebra-cabeça complexo da vida.

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