sábado, 8 de outubro de 2011

Finitude

Fiquei quase uma semana sem escrever, o que para mim é impensável em circunstâncias normais. Normalidade zero numa semana para se esquecer, daquelas que não fariam a menor falta se jamais tivessem existido. Ela culminou com a perda de um querido amigo, uma pessoa incontestavelmente do bem. Bom filho, bom marido, bom pai, homem educado e gentil, profissional exemplar, um cidadão muito diferenciado. Nenhum desses atributos conseguiu livrá-lo de um mal avassalador, de uma doença agressiva que, em aproximadamente doze meses, lhe ceifou a vida aos cinquenta e dois anos.
A cara da morte é conhecida desde o dia em que nascemos. Ela desrespeita a lógica, estando presente o tempo todo. Se esgueira pelos espaços concedidos ou não, por locais e situações inimagináveis, em condições imprevistas, momentos inesperados, sorrateira e dissimulada. Seu bote é certeiro e infalível, sabidamente eficaz e com data marcada, só desconhecemos a agenda. Fazer parte de uma família feliz não é antídoto para a sua peçonha, pouco importa a ela que o alvo seja amado e indispensável. Tomada de sanha terrível, se apresenta inexorável e fria, impassível ao anunciar a decisão irreversível.
A fé que professemos não nos salva, a descrença também não. Talvez conforte ou ignore, às vezes amenize, dependendo do caso, porém não nos escuda do implacável ajuste de contas. Temos tempo finito e imprevisto, incondicional acessório de todas as caminhadas. Solitária ou solidariamente seremos colhidos pela mão do destino, tão logo chegue a hora. Não pedimos para vir nem para ir, apenas acontece. Podemos conspirar a favor, sem dúvida, há quem proceda assim por opção. Mas em geral amamos a vida e não gostaríamos de conviver com essa dúvida permanente. Qual seria a melhor maneira de enfrentar a maior de todas as certezas?
A incomensurável complexidade desse tema é proporcional ao valor da patente de uma fórmula com a solução do problema. Entretanto, nos resta uma alternativa mais simples, de praticidade garantida e comprovada, embora estranhamente pouco utilizada. Diante da imprevisibilidade da morte devemos viver com intensidade. Precisamos aproveitar cada momento com a sofreguidão dos sedentos, saborear cada minuto com a fome dos insaciáveis, compreender que cada segundo pode ser o último. Óbvio que teremos sempre compromissos e deveres, afinal para a sobrevivência há um preço cobrado nas caixas registradoras. Contudo, jamais haverá equivalência ao valor inestimável da vida, ao amor dos que nos cercam, à alegria da convivência, à felicidade do desfrutar de tudo na companhia de quem nos quer bem.
Enfim, lembramos disso ao sofrermos pelo que perdemos e nos sentirmos lesados. Egoístas, a dor de quem fica e a visão do fim. Lamentamos porque permanecemos, porque não aceitamos o desenlace, porque o corte nos machuca. E depois, como continuamos, nós e quem se foi? A resposta possível se restringe a esse plano conhecido e não me parece inspirar mudanças. As exigências do cotidiano se incumbem de nos atirar à mesmice em breve e logo nos deparamos desprezando os valores mais importantes de nossa existência. Até quando? Até o fim.
P.S.: Não acredito em coincidências. Meu texto anterior foi intitulado "Chorar faz bem". O texto de hoje é dedicado ao meu querido amigo Edu, cuja passagem por aqui iluminou as pessoas mais próximas e as mais distantes. Meu amigo, que o seu caminho de luz seja eterno.

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