sábado, 6 de abril de 2013

Quem são os animais irracionais?





Através dos séculos, diz a máxima que os gatos possuem sete vidas, tornando-os felizes privilegiados de seis oportunidades de retomada que outras espécies não dispõem. Na prática, a natureza desconfiada e peculiar dos gatos, a suavidade de suas passadas, a rapidez de reação diante do inusitado, a flexibilidade de seus movimentos explicam os escapes conseguidos. Favorecidos por esse comportamento, ainda que sejam obrigados a iniciarem suas quedas de costas, terminam apoiados nas quatro patas.
Afora a crendice popular e a agilidade felina, a milenar sabedoria dos ditados nos propõe interpretar seus sinais com mais atenção. Ao contrário, a humanidade parece decidida a abreviar sua trajetória já exígua por aqui. As atitudes tresloucadas do ser humano sugerem uma crescente perda de noção das graves conseqüências de atos insanos. Há uma declarada conspiração contra o bem mais precioso sob a nossa guarda: a vida. Risível imaginar tais atitudes como defesa da existência, como luta pela sobrevivência. Seria cômico não fosse trágico.
As pessoas estão muito estressadas pelos problemas particulares, pelas agruras da vida, pela desigualdade, pela injustiça, pela imperfeição do mundo. Ao reagirem, contra tudo e contra todos, se mostram cada vez mais surpreendentes, mais intempestivas, mais instintivas, portanto, mais animais. Não raro nos deparamos com situações inacreditáveis, imagens chocantes nos obrigando a uma reflexão maior sobre o rumo tomado pelas coisas. Precisamos estancar a sangria ou estaremos fadados a um triste desfecho, muitos ou todos, mesmo se não formos protagonistas dos confrontos.
Esse foi o caso do ônibus que despencou do viaduto no Rio de Janeiro. Ao saber do acidente, de imediato procurei informações sobre a namorada do meu filho. Ela não gosta de dirigir, mora na Ilha do Governador e estuda no centro da cidade, pelo horário era potencial candidata a estar naquele transporte. Para o meu alívio, não estava. Mas, poderia ter sido uma das inocentes vítimas do assustador enredo cuja violência até agora não consegui entender. Além de muitos feridos, sete vidas se perderam, expressão a nos remeter aos gatos outra vez. Com certeza eles não atacariam o motorista de um veículo em movimento. E, se estivessem no volante, não desviariam a atenção antes de parar o veículo.
Quase simultaneamente, em outro ponto do Rio, também num transporte coletivo, três desatinados se apoiaram na impunidade de casos anteriores e se valeram da insegurança reinante para agredirem homens e violentarem mulheres, incautos daqui e do exterior. Se aos estupradores da van podemos atribuir o rótulo de marginais desprovidos de qualquer resquício humano, o que dizer do estudante universitário que atacou o motorista do ônibus? E de tantos outros protagonistas de desvarios no trânsito, nos shoppings, nos bancos, nos estádios de futebol, nas escolas, enfim, na cena cotidiana em geral, cosmopolita ou não.
Afinal, quem são os animais irracionais?


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